sábado, 14 de dezembro de 2013
Foto de um dos grandes ídolos do Galo da Comarca: João Baptista Nascimento, ou só João Gostoso na vida futebolística, jogou de 1926 até 1948, portanto, 22 anos no XV, participando de 414 jogos e marcando 235 gols. Um nome, entre outros, que será sempre lembrado.Na foto até o galo foi colorizado nas cores tradicionais.
terça-feira, 3 de dezembro de 2013
sábado, 16 de novembro de 2013
Jaú, 24 de janeiro de 2010
Prezada
Senhora Dona Lydia
Querida esposa
Hoje, dia 24 de janeiro,
estamos completando cinqüenta anos de casados. São cinqüenta anos de convivência fraterna,
(às vezes nem tanto por minha culpa) nos quais pudemos realizar alguns de
nossos sonhos, ter nossos filhos, nossos netos e poder ajudar a eles até
materialmente que sempre foi meu desejo. Trabalhar, galgar postos mais altos
possíveis, com melhores ganhos, para poder ajudar na hora em que eles
precisassem. E você é testemunha de que fizemos o máximo por eles. Não é o caso
de se dizer aqui o quanto fizemos. O que importa para nós é o que foi feito. E
quanto lutamos. Juntos. Com muitos e muitos acertos e também alguns tropeções
pelo caminho. Com muitos erros e muito recomeço. Mas como é bom lembrar as boas
e grandes emoções que sentimos pelo caminho. O primeiro grande momento de
emoção foi nosso casamento com a presença de três padres no altar oficiando a
cerimônia. Jamais vi um casamento com tanta gala. Infelizmente não temos as
fotos. A segunda grande emoção foi o nascimento do primeiro filho, embora os
momentos de aflição que você passou, ficando no hospital por quase um mês. O
nascimento da Lúcia foi outro momento de grandioso contentamento. Os momentos
de alegrias com suas formaturas no primário e na Academia. O casamento da
Lúcia, tão novinha, e depois a espera por dois anos pelo Roberto primeiro neto,
depois a Lidiane e o Rodrigo. Grandes
momentos de alegria. E depois, recentemente, grande momento de dor tivemos que
passar pelo falecimento da Lúcia. Aqui você demonstrou uma força imensurável.
E, quanta dedicação de você para criar os filhos e os netos. Especialmente os
filhos. Só quem conviveu com você para saber o que foi sua vida de dedicação à
família. Eu diria até que não foi uma dedicação, foi uma devoção. Quanto desvelo e carinho você dedicou a eles. Você é uma
mulher forte, abençoada por Deus. Igual a você talvez tenha alguma mulher no
mundo, mas melhor que você só a Mãe de Cristo.
Vejo em mim muitos defeitos (alguns incorrigíveis,
cavalo velho não pega andadura), mas tenho me esforçado para ser o melhor
possível. Talvez não tenha te dado tudo
o que você merecesse. Mas me esforcei, especialmente no campo material. Você
sabe o quanto me dediquei para proporcionar á minha família tudo de bom.
Algumas coisas poderiam ser feitas de outro modo. Outras nem precisariam ser
feitas. Outras poderiam ser feitas e não foram. Enfim, se passaram cinqüenta
anos, de muitas lutas, muito trabalho. Fomos e somos felizes comemorando ao
nosso modo: dedicando-nos á nossa família.
Que Deus nos abençoe e nos dê vida longa.
Obrigado.
Geraldo
Jaú, 24 de janeiro de 2010.
terça-feira, 29 de outubro de 2013
Essa equipe do XV de 1941. Há dois jogadores que não foram identificados e alguns deles cheguei a conhecer muitos antos depois dessa data. O Spoldari, o Dornelas, o Carvalho com quem tive amizade e o Botter também. Note como era o campo do XV. Sem alambrado, nenhuma cerquinha a separar a torcida do campo de jogo. Resta a saudade, especialmente dos familiares desses cidadãos.
domingo, 13 de outubro de 2013
Mais uma formação do "Galo" de 1951. Desse time o Clóvis foi jogar no Fluminense do Rio. Américo passou pelo Palmeiras e grandes time do Brasil e jogou na Itália. Era bom de bola pra caramba" O Duvílio tinha um petardo no pé esquerdo. O Itamar era o sacrificado desse time. O que a torcida pegava no pé do coitado dava dó. Jogar como ponteiro ainda mais no Arthur Simões que o gramado ficava um metro do alambrado.
segunda-feira, 7 de outubro de 2013
domingo, 22 de setembro de 2013
Galo de 1935
Time do Galo em 1935. Postagem em homenagem ao ao Senhor Brasílio Raul Américo. Na foto é o que está agachado apoiado no joelho esquerdo. Seu apelido era General e é simplesmente o pai do jogador Edu (Jonas Eduardo Américo) do XV, do Santos e da Seleção Brasileira. Outros de seus filhos Vicentinho e Zizico foram bons de bola.
segunda-feira, 16 de setembro de 2013
"Som Mutante": Homenagem ao amigo e professor "Antonio Celso"
"Som Mutante": Homenagem ao amigo e professor "Antonio Celso" . Quero que saiba que em sua terra natal entre os milhares de admiradores de seu trabalho, estou incluído. Seu blog já esta em meus favoritos. Saúde e paz para ti e os teus.
sábado, 14 de setembro de 2013
quinta-feira, 12 de setembro de 2013
Homenagem para alguns que já foram junto ao Pai.Segundo quadro da Congregação Mariana da Matriz de São Sebastião. De pé: Lourenço, João Avelino, seu irmão, Geraldo Avelino, Armando, Airton, Geraldo, Tau e Osvaldo. Agachados: Vicente Américo, Nelson, Hildebrando, Alcyr e Adriano. O campo, onde é hoje a Praça Lopes Rodrigues.
quarta-feira, 21 de agosto de 2013
A primeira vez que vi Raquel
1 -
A primeira vez que vi aquela menina foi num baile na Tuia da Fazenda
Saltinho.
Nos meus quinze anos, era meu primeiro baile prá valer já com interesse
nas mocinhas que eu começava a cortejar. É claro que eu tinha amizade com
algumas garotas das fazendas vizinhas do sitiozinho onde eu morava, mas as via
realmente como meninas.
Antes dessa data, eu ia aos bailes pra ficar perto do sanfoneiro vendo e
ouvindo a “oitenta baixos” resfolegar, ás vezes um violão a acompanhar e, por
falta de pandeiro, um par de colheres a estalar. Aquele som da sanfona cativava
e entorpecia meus sentidos que, para mim, no momento, só existia aquele som.
Mas, nessa noite, depois de ter tomado um belo banho na pequena
cachoeira que tinha na fazenda, e depois de muito me aprumar, vesti minha
melhor roupa e resolvi me divertir. Essa melhor roupa era simplesmente uma
calça azul de brim e uma camisa de mangas curtas numa cor que eu chamaria de
azul claro. A calça de brim era de um tecido meio grosso que quando roçava uma
perna na outra, ao andar, fazia um barulho esquisito. O calçado um tipo de
sapatão, de couro grosseiro, meio amarronzado, até pelo tempo de uso nas
estradas poeirentas.
Eu não me achava feio, mas era tímido, até pela idade e, meio sem jeito,
cheguei á tuia e demorei a entrar. Fiquei parado na porta só observando o
movimento lá dentro. Fui entrando aos pouquinhos que era pra não me assustar,
um pouquinho mais pra frente, um passo mais acolá, até que por fim estava lá
dentro perto da moçada, os homens prá cá e as mulheres prá lá, do outro lado. O
pessoal só se juntava a hora que a sanfona começa a tocar. Mas depois que
acabava a dança, cada qual pro seu lugar, não tinha essa de o par ficar
conversando tentando segurar a dama para a próxima dança. Os únicos pares que
ficavam juntos eram os casais firmes, aqueles que já estavam namorando, com
autorização dos pais. Os tímidos e imberbes como eu ficavam no fundo do salão
como que estudando as meninas de nossa idade, igualmente atrás encostadas na
parede de tuia ou sentadas, já que era comum bancos para as damas sentarem.
Esses assentos que tinham lugares para três ou quatro pessoas eram emprestados
pelos moradores da colônia. Os candidatos á dança ficavam na
marcação de sua dama e mal o primeiro toque no teclado era aquela correria,
para que ninguém tirasse sua escolhida. E o sanfoneiro sabedor disso dava um
toquezinho e parava. Aí os apressadinhos tinham que voltar pro seu lugar. Não
se sabe se o fazia por malícia ou se era simplesmente uma maneira de escolher
qual seria a música a ser tocada. Era um sufoco. E não era permitido dar
“taboa”, o que significava que a dama não podia recusar uma dança, fosse qual
fosse o cavalheiro. Se ela recusava, recebia um castigo de ficar sem dançar por
certo tempo. Mas acredito que houvesse um jeito de combinar, de furar essa
situação, pois eu notava que certas moças ficavam quase de costas para os
cavalheiros, ficavam um pouco mais pra trás, fazendo de conta que não iam
dançar, aí, um pouco no retardo, o cavalheiro saia para tirar a sua dama. Isso
se percebia que era combinado, pois, em muitas contradanças, os pares se
repetiam ao voltearem no salão, até porque, após algumas danças, já estava mais
ou menos definido o jogo da sedução. Mas havia também o momento do lenço que
consistia em se pendurar um lenço no lampião de querosene; isto significava que
não mais o cavalheiro tirava a dama e sim esta escolhia com quem ela queria
dançar. Aí ficava caracterizada a preferência da moça por um determinado
cavalheiro, nascendo assim os namoros.
E foi apreciando esses exercícios de conquista, quando as moças saíram
para a dança, reparei lá atrás uma menina que não saia para dançar. No
primeiro olhar, uma chama já faiscou em meus olhos. Fiquei encafifado e comecei
a fitá-la até que uma hora nossos olhares se cruzaram. Ela abaixou a cabeça,
meio envergonhada. Talvez fosse também seu primeiro baile, quem sabe em busca
de um namorado. E assim passei boa parte da noite a flertá-la. E como era
difícil encontrar uma posição para ficar ali postado, de pé, uma hora enfiando
a mão no bolso, outra encostando levemente na parede da tuia. De tanto
admirá-la, pude notar que não era muito alta. Talvez um metro e sessenta e
cinco imaginei. Cabelos cortados até o ombro, meio cacheados e que caiam sobre
a face quando ela os balançava ao falar com alguém. Usava um vestido rodado,
estampado com algumas listas e flores ou algo parecido. Na cintura, trazia um
cinto do mesmo tecido do vestido com uma bela fivela. O cinto apertado
destacava a fina cintura e o corpete do vestido sem decote, também justo,
realçava seu busto.
Como eu não dançava ficava difícil a empreitada. Como chegar à
menina? Que desculpa eu daria? E mesmo porque nesses bailes, além da mocidade
em pé de guerra nas conquistas amorosas, havia também as comadres casadas que
acompanhavam as meninotas tal qual aquela carinha de anjo. E se o pai dela
estivesse lá? Quando se tratava de paquerar sua filha os pais da década de
quarenta não eram fáceis de encarar. Mas passei boa parte da noite sem saber o
que fazer. Olhava na menina e ela olhava prá mim. E ficamos naquele flerte,
silencioso, e carinhoso alheio ao que se passava ao meu redor.
No baile, estava também uma de minhas tias, solteira, irmã de minha
mãe, aliás, a única ainda solteira, caçula entre as mulheres, que é mais
velha que eu oito anos e pouco. Durante as danças, nos momentos em que não
estava dançando com seu par (ela já estava namorando firme), ela vinha
conversar comigo e, ás vezes, até arrastava junto seu namorado.
Embora morássemos em fazendas mais ou menos próximas ficávamos sem nos
ver por até duas semanas. E num desses momentos de intervalo, vi
que minha tia estava conversando com a menina de meus olhos. Conversavam e pude
perceber que ela olhava para mim, esboçando um sorriso que transformei numa
esperança mais concreta.
Nos bailes nas fazendas havia o costume de se dar uma pausa para
descanso dos músicos e isso ocorria sempre por volta de meia noite ou meia
noite e meia. E é aí que chegou a hora do “anisete” ou quentão ou outra bebida
preparada para servir aos presentes. Nada de grandioso Isso se constituía
no seguinte: os instrumentos musicais se calavam, o sanfoneiro ia pra cozinha
comer alguma coisa e cada dama pegava um bule e alguns copos e ia servir aos
cavalheiros a sua porção. Foi a minha oportunidade. Embora todo
trêmulo, dei um jeito de esperar que o meu copo fosse cheio pelas mãos da
menina que eu tanto admirava. Desviei de uma e de outra que queriam encher meu
copo até que ela chegou perto de mim. Estendi meu copo em sua
direção sem muito estender o braço para obrigá-la a chegar perto de mim. Antes
que o líquido atingisse meu copo alguém passando por mim, num leve toque, desequilibrando-me
fez com que o líquido fosse ao chão. Foi o que me salvou. Demos risada um pro
outro e, com mais cuidado, meu copo ela voltou a encher. Foi o máximo que
pude fazer naquele baile. Mas essa passagem ficou marcada mais devido ao inusitado
e lirismo da cena. Passamos o resto da noite a nos entreolhar. Lá pelas quatro
horas quando o baile chegava ao fim esperei para ver com quem ela ia embora.
Saiu uma turma que parecia ser seus irmãos, talvez pai e mãe e outra mocinha
que eu já conhecia de vista, provavelmente colega da mesma fazenda.
Como o baile não era muito distante de onde eu morava, fui para casa
andando nas nuvens, meus pés nem pareciam tocar o solo, era como se estivesse
planando, voando. Na verdade eu flutuava. Na cabeça mil pensamentos a
volitar e aquela imagem viva na retina que eu esforçava-me para não deixar
esvanecer. Mal pude dormir quando fui para a cama às quatro e meia.
Passei o resto da noite pensando na menina, ou melhor, o restante de uma
hora pois eu tinha que levantar dai há pouco, as cinco e meia para rumar para a
mangueira tirar o leite das vacas, que era minha tarefa.
As duas semanas que se seguiram não foram nada fáceis. Não tirava da
cabeça a imagem da menina por um instante e não pude falar com minha tia para
saber alguma novidade, alguma coisa do que elas teriam conversado na noite do
baile.
No domingo seguinte, pela manhã, bem cedinho, arriei um cavalo que era
de meu tio, com quem eu morava, e fui até a casa de meu avô falar com minha tia
que me disse que a Raquel (esse era nome da menina), havia se interessado por
mim, perguntando meu nome, onde eu morava e mandando um recado de que iria à
missa que era celebrada mensalmente no bairro, portanto no próximo domingo.
Devo dizer que essa informação deixou-me feliz, sobressaltado e
esperançoso. Passei a semana contando os dias que faltavam para domingo.
Como demorou a passar a semana! Eu ia contando os dias, hoje é segunda, terça
e, assim por diante, até que chegou o esperado domingo.
Era costume todos os meses participar da missa do bairro, mas, naquele
domingo, o que eu pensava mesmo era na Raquel. Levantei como sempre de
madrugada, bem antes de o despertador tocar e tomei o rumo da mangueira para a
ordenha das vacas. Após esse trabalho, fui tomar meu banho na cachoeira,
vesti minha melhor roupa, arriei o cavalo e fui para o vilarejo para assistir a
missa. Procurei um lugar bem próximo onde Raquel estava. Terminada a missa o
pessoal ficou batendo papo em grupinhos nas proximidades e cheguei perto onde
Raquel estava conversando com minha tia. Cumprimentamo-nos, dei a mão a ela e
procurei alongar um pouco o aperto de mão. O trecho do caminho na volta era
comum a nós dois e por isso fui a pé, puxando o cavalo pelas rédeas, até chegar
à porteira da entrada da fazenda onde ela morava. Paramos um pouco e quase nada
conversamos, pois estava muito difícil encontrar assunto. Pensava numa coisa
para falar, mas não achava as palavras até que lembrei de elogiar seu vestido
com que estava no baile, que ela estava muito bonita naquela noite. E foi só.
Despedi-me, com um longo aperto de mão, esperei que ela passasse a
porteira, montei em meu cavalo e fui para casa.
Acho que devo fazer uma pausa nesse enfoque para fazer uma explicação
sobre o fato de estar morando com um tio como dito acima. Nós éramos uma
família de seis pessoas, pai, mãe e quatro irmãos, todos homens. Meu pai vinha
de uma família que trabalhava como administradores das fazendas em que se
ajustavam para trabalhar. Meu pai era administrador e ao mesmo tempo dirigia os
veículos que houvesse nas fazendas. Lembro um pouco de meu pai no volante de um
caminhãozinho passando por nós, carregado com as mais variadas cargas da
fazenda, sacos de café, de milho. Nunca deixava que nós andássemos na carroceria
do caminhão; hoje sei que era perigoso. Minha mãe não teve oportunidade de
estudar regularmente, pois, na década de 1920 até 1930, na zona rural, não
havia escolas. O pouco que ela soube de leitura eu a ensinei quando eu já era
um rapazote, ensinando-lhe inclusive a assinar seu nome.
Minha mãe casou nova, com dezoito anos. Teve um filho em janeiro de
1933, eu em novembro de 1934, outro em fevereiro de 1936 e o caçula em agosto
de 1939. Quando meu pai faleceu em junho de 1940, eu tinha cinco anos e meio.
Devido a essa idade, pouco lembro de meu pai. Lembro que ele me sentava em seu
joelho e brincava de cavalinho com dois ao mesmo tempo, um em cada perna.
Ás vezes, nós íamos até seu trabalho na máquina de beneficiar café e ele
brincava conosco no monte de café. Tomei algumas palmadas, se é que se pode
dizer assim dada minha tenra idade. Como no dia em que descascando cana para
chupar, a faca escapou da cana e cortei o rosto de meu irmão mais novo, na
altura do queixo. Outra vez, morando fazenda Pereirão, nos fundos da
colônia passava um riacho que era cercado por arame farpado para impedir que o
gado fugisse. Havia um barranco sem grama, totalmente liso e bem íngreme. Os
garotos mais velhos tinham o costume de pegar as palmas de figo da índia, que são
bem grandes, e lá em cima, sentar em sobre elas e escorregar morro abaixo. E lá
embaixo havia a cerca de arame farpado. No momento em que estavam chegando á
cerca eles brecavam a corrida forçando o dedão dos dois pés contra o chão. E
conseguiam parar. Um dia, amolei tanto meu irmão mais velho que eu queria
escorregar e ele atendeu meu pedido e me colocou em cima da palma. Só que, como
era a primeira vez que eu deslizava, não consegui brecar, ou melhor, brequei
até bem demais, cravando os dedões dos dois pés com tanta força que fui jogado
contra a cerca, rasgando o peito e um pouco da face no arame farpado. Foi uma
correria para rumar para a cidade para suturar o corte feito no peito. A
cicatriz do peito permanece até hoje, passados 77 anos. Nesse dia quem levou as
palmadas foi o mais velho.
Lembro muito bem o dia em que meu pai saiu de casa num carro, com a
cabeça recostada atrás e pelo vidro trazeiro do carro segui sua figura até onde
deu para ver o carro na estrada poeirenta. Naquela inocência de cinco anos nem
sabia que meu pai estava doente. Foi a última vez que o vi vivo. Daí só
foi vê-lo depois de um tempo, sobre uma lousa branca na morgue do hospital e
quando um adulto qualquer ergueu-me para beijar seu rosto magro e com barba.
Parece-me que esse adulto teria dito "beija seu pai". Foi a última
vez que o vi.
Confesso que hoje sinto mais saudades de meu pai do que na infância,
pois, como já disse, na idade de cinco anos não podia avaliar o que seria viver
sem um pai.
Continuei minha vida de criança vivendo os dias, semanas meses e anos
sem sequer pensar em sua morte, como uma ausência, embora todos os anos nossa
mãe nos levasse ao cemitério para uma visita ao seu túmulo que era uma cova na
terra, marcada com uma cruz de ferro, feita pelo meu avô.
Após a morte do pai, fomos morar uns tempos com meu avô Marcioto numa
fazenda na região. A fazenda Joanico era bem grande. A família do vô era bem
numerosa. Tinha uma força de trabalho muito boa, composta por seis adultos,
mais a criançada que, se não ajudava a carpir o café, servia para levar comida
na roça e buscar água nas bicas ribeirinhas ou então para limpar o pé do
cafeeiro nas colheitas dos grãos. Isso se resumia em levantar a “saia” do pé de
café e com um pedaço de pau, ou uma vassourinha feita de ramos de bambu,
afastar os grãos do tronco para facilitar o trabalho do adulto na hora de
juntar os grãos com o rastelo.
Uma das bicas d'água, onde íamos encher os corotes, tinha em seu caminho
uma árvore e se dizia que em sua sombra havia morrido uma pessoa. E nós
tínhamos que passar em baixo dessa árvore para atravessar a pinguela, ou então
dar uma grande volta para fugir da árvore. E cadê a coragem para
enfrentar a situação, mesmo durante o dia. E o danado do corote era pesado
embora não o levássemos cheio. Como já disse, a família de meu avô era muito
disputada pela força de trabalho e pela honradez que representava seu nome. O
vovô Marcioto, nas horas de folga do trabalho na lavoura, era um exímio faz
tudo. Era folheiro, colocando cabos em latas de óleo para servir de caneca. Era
marceneiro, fazia mesas, cadeiras, mesas para cilindro de amassar pão etc..
Tinha sua oficinazinha da qual não deixava que as crianças se aproximassem. E,
ainda sobrava tempo para pegar sua “oito baixos” e tocar algumas músicas
trazidas da Itália, quando de lá veio, aos dezoito anos, já casado, para
trabalhar nas lavouras de café na região de Torrinha. Na mesa farta, na sua
simplicidade rural, sempre havia o que bastasse para alimentar a todos.
Com a criação de galinhas, sempre havia uma para ser sacrificada, além da
produção de ovos. Aliás, com tanta gente, precisava de dois frangos
em cada refeição que eram escolhidos enquanto dormiam no poleiro. Quando a Vó
esquecia de pegá-los, havia um cachorro bem treinado que se encarregava de
caçá-los e segurando-o até que nós o pegássemos. Mas, com tantas bocas
para alimentar, suas sete, mais cinco de nossa família, meu avô sentiu-se
impossibilitado de continuar a nos dar guarida. É claro que não sei o diálogo
que houve entre minha mãe e meu avô. Acredito que ele tenha explicado para ela
a situação como pai que era, que não dava mais etc.etc. Foi aí que
dei com a cara na cidade.
A mãe, sem nenhum estudo, mais três crianças para olhar e um para
carregar no colo, chegou á cidade sem eira nem beira. Veio com a cara e sem
muita coragem ela me disse muitos anos mais tarde. Dois sacos com poucas
peças de roupa era tudo o que trazia. Fomos abrigados na casa de uma família
que cedeu o salão onde teria funcionado uma casa de comércio. Ali ficamos um
tempo mudando-nos depois para um casebre de madeira num outro bairro da cidade,
nos altos da Rua Governador Armando Sales. O piso da casa era de terra, com
muitas frestas pelas paredes e no local onde as tábuas outrora tocavam o solo
estavam carcomidas pelo tempo, deixando um vão que dava para passar um gato.
Mas aí já era nossa casa, com banheiro fora, água suja correndo perto da porta.
Dormíamos espremidos numa cama com o conforto que aquela alma forte podia nos
dar no momento. Ela deve ter sofrido muito com isso e por isso. Muito do que
sei ela contou-me anos mais tarde nas vezes em que tocávamos no assunto. Mas
notava que não gostava muito de falar nesse passado que só lhe trazia tristes
recordações. Eu também depois de adulto não procurava falar do passado para não
vê-la sofrer. Acredito que deve ter sido angustiante, dolorido em todos os
sentidos, até desesperador. Dores lancinantes, profundas a lhe machucar o corpo
físico e espiritual. Quanto deve ter sofrido ao se defrontar com aquele caos em
que se transformara sua vida. Que grandeza interior dessa mulher. Nunca
lembro de tê-la visto chorando ou maldizendo sua dita. Se chorava, chorava
sozinha, as escondidas para não trazer preocupações para aquelas cabecinhas que
só queriam brincar e comer, se houvesse comida.
O ser humano não consegue descrever suas emoções, sejam de dor ou
felicidade, assim deve ter acontecido com essa mulher. As emoções você sente,
mas não consegue traduzir em palavras. As emoções formam-se num labirinto
insondável da nossa mente e, ás vezes, nos fazem chorar e, outras, sorrir. E
foi nessa nova casa que adoeci com tifo ficando internado na Santa Casa muito
tempo. Também não sabia da gravidade de meu caso. Lembro que minha cama foi
cercada e isolada por biombos dos demais doentes. Minha mãe passava todos os
dias bem cedinho para ver como eu estava. Depois de algum tempo mudamos
novamente para outro bairro num casebre um pouco melhor. Pelo menos o chão não
era de terra e sim de cimento já gasto pelo tempo.
Passávamos o dia na “Casa da Criança” no regime de semi-internato.
Entrávamos ás sete horas da manhã e saíamos as cinco da tarde. Na entidade,
tomávamos o café da manhã logo na chegada, depois, ao meio do dia, havia o
almoço e, antes de ir para casa jantávamos.
Não recordo muito bem, mas parece que entre o almoço e o jantar havia um
lanche. Como o mundo estava em guerra, o cardápio não variava muito na “Casa da
Criança”. Quando eu frequentava o primário fora da Casa, no “Grupo Escolar Dr.
Lopes Rodrigues”, nós levávamos lanche. E, ainda havia a sopa no Grupo que uns
tomavam e outros não. O Grupo ficava na esquina da Rua Aristides Lobo Sobrinho
com a Tenente Navarro.
Devido á crise mundial, não se encontrava alimentos para comprar. O óleo
e o açúcar eram racionados; precisávamos ficar na fila durante horas para se
conseguir comprar um litro de óleo passado direto do tambor para o vasilhame
que se levava de casa. Farinha também era racionada e igualmente só era
conseguida mediante fila e um quilo por vez. O posto de venda ficava na Rua
Visconde do Rio Branco nas proximidades do Mercado Municipal. Nós crianças
ficávamos na fila guardando lugar para minha mãe comprar os alimentos e também
comprava o açúcar mascavo. E como era gostoso o açúcar mascavo! Minha mãe escondia
a lata de açúcar mas a gente sempre dava um jeito de encontrar para comer um
pouco.
Além na miséria em que se encontrava a família o mundo vivia uma crise
terrível. Tudo se comprava em um quilo. E a compra devia durar até o dia da
próxima compra, ou ficar sem. É claro que eu não sabia nada disso. Só sabia que
tinha que enfrentar fila e me preparar para apanhar quando a mãe descobria o
“assalto” na lata de açúcar.
Quando íamos e voltávamos para a casa da criança sempre os três juntos,
descalços, com aquela vontade danada de nunca chegar e ainda ter que ficar
esperando o caçula que não queria andar; quando ele empacava, sentava na sarjeta
e ficava ali até que o mais velho o colocasse de cavalinho, ou nas costas ou no
pescoço para podermos caminhar.
Nossa entidade ficava distante de nossa casa de 500 a 600 metros. Mas
pela demora parecia uma eternidade. Minha mãe só chegava do trabalho quando
estava escuro e nós ficávamos brincando no calçada onde até deitávamos e
acabávamos pegando no sono. Aí, um outro anjo de bondade, que se chamava
Sussen, nós pegava e nos recolhia dormindo. Isso acontecia frequentemente. Um
irmão da Sussen , Jamil, foi meu padrinho de crisma. Nessa época, também minha
mãe recebia alguns alimentos dos Vicentinos.
Com oito ou nove anos, comecei a engraxar sapatos nas ruas do centro da
cidade. Colocava na caixa a graxa preta e marrom, tinta preta e marrom, escova
velha de escovar dente para passar a tinta e dois panos macios das dar o lustro
no calçado. Devia haver um cuidado muito grande para não sujar as meias do
cliente. Para evitar a sujeira da meia usava-se uns pedaços de cartolina
flexível, que se colocava entre a meia e o sapato. Com isso a meia branca do
cliente estava salva. Se ocorresse de sujar a meia corria-se o risco de não
receber o valor do trabalho. Com esse dinheirinho conseguido com a caixa de
engraxar dava para frequentar a matinê e, ás vezes, comprar uma pipoca ou
sorvete e até um gibi.
A frequência no cinema nas chamadas matinês era obrigatória por causa
dos seriados que eram apresentados em capítulos, um em cada domingo. Nessas
sessões vespertinas do cinema, era exibido em geral um desenho animado, em
seguida, um filme e, logo após, o seriado. No momento em que o mocinho aparecia
na dela, era uma vibração e gritaria impressionante. Cada seriado tinha em
regra de doze a quinze capítulos e quem perdesse um perdia o fio da meada. Aí,
o jeito era perguntar para algum colega o que havia se passado e em que perigo
teria terminado o capítulo. Durante a semana, o assunto era saber como o
mocinho haveria de se safar da situação. Em toda a infância, assisti e
acompanhei muitos seriados, mas ficou marcado para mim Os Perigos de Nyoka
(para nós nioka e não naioka), Águia Branca, e a Deusa de Joba. Estes, consegui
comprá-los quando já estava na casa dos sessenta anos. E confesso que foi com
muita emoção que os assisti. Havia também um seriado que se me lembro tinha
título de homem foguete. O mocinho usava uma espécie de foguete nas costas para
poder voar. Era fantástico. Mas o que eu mais gostava era dos seriados de
faroeste. Ver o cavaleiros montarem seus cavalos com o mesmo já galopando era
demais. Mais tarde, morando em fazenda nunca tentei fazer o que havia visto nas
telas. Nossas horas de lazer eram aplicadas jogando bola de meia na calçada que
na época era de terra. Quando cimentaram a calçada acabaram com nossa alegria.
Mas espaços com terra para se jogar bolinha de gude não faltava. Quando
queríamos jogar bola, era só descer a rua um pouco e jogar no campo do
Palmeiras que ficava onde hoje é o Grupo Escolar Dr. Lopes Rodrigues. Aí,
quanto vezes não ficava embebecido de ver o Zerica, o Paulo Burini, Atílio
Pengo, Caracol , Pintado, Madela irmão do Paulo Burini e outros meus deuses e
heróis. Também brincávamos de pega-pega, esconde-esconde e, vez ou outra,
também brincávamos junto com as meninas de passa anel, corre lenço. Era papel
das meninas convidarem os meninos para brincarem com elas. Nessa tenra idade,
já existia atração pelas meninas e eu ficava feliz quando era convidado para
brincar. Mas nunca era a menina que gostava da gente quem nos convidava. Sempre
vinha outra e dizia: a Terezinha pediu para você vir brincar com a gente. Nas
brincadeiras de passa anel e corre lenço eu podia demonstrar meu interesse pela
Terezinha deixando o anel em sua mão. Quando havia reclamação dos outros, a
gente mudava um pouco. Brigas pra valer nunca houve e quando digo brigas falo
dessas com socos, rolagem pelo chão ou nariz sangrando. Havia também os
momentos de religiosidade que consistia em "celebrar missa". A turma
se reunia, geralmente em nossa casa, e um de nós, meu irmão ou eu nos vestíamos
de padre. A batina era um vestido da mãe, amarrado na cintura, para não pisar
em cima. Cada criança que quisesse "comungar" deveria trazer sua hóstia
de casa. Essas hóstias eram os fundos dos copinhos de sorvete. Eu levava muito
a sério essas celebrações tanto que um dia levantei bem cedinho, ainda escuro,
resolvido a falar com os Padres do Colégio que eu queria ser padre. Sentei na
escada e esperei até que os portões fossem abertos. Naquele dia ficaram
fechados e a ideia só ficou nisso.
Os dias foram passando, o tempo passou e já na casa dos dez anos, de tão
levado que eu era, minha mãe levou-me para morar no sítio com um tio. Fui sem
reclamar e sem colocar objeções. Não lembro de ter reclamado ou chorado por
causa disso. Pegamos o ônibus rural que fazia o trajeto de Jaú a Bocaina e saia
as quinze horas e trinta minutos do mercado municipal. Meu tio morava no sítio
do Fuzeti, distante uns dez minutos da cidade. No outro dia cedo, minha mãe
voltou para Jaú e eu fiquei. Passei quatro ou cinco anos sem ver minha mãe e
meus três irmãos. Confesso que, à noite, ás vezes eu chorava baixinho. Minha
tia, irmã de minha mãe era muito carinhosa e me tratava como seu filho. Não
fazia distinção entre os seus filhos e eu. Uma boa alma, eu diria hoje.
Nos primeiros dias, tive dificuldades nas rotinas da fazenda. Vivia-se a
luz de lampiões de querosene. Mal escurecia, acendia-se os lampiões, fechava-se
a casa e nada mais havia para ser feito, a não ser deitar na cama e dormir. Por
conseguinte, no outro dia, levantava-se bem de madrugada. Quando começava á
clarear o dia era um alívio.
Passado algum tempo, comecei a aprender os trabalhos do sítio. Comecei
com os serviços leves, depois já selava o cavalo e rumava para a cidade de
Bocaina levando o leite para o dono do sítio. Era um passeio e não um trabalho.
O cavalo em que eu cavalgava era branco totalmente, bem gordinho, super
manso. Uma beleza de animal. No pasto o chamava pelo nome Branquinho vem, e ele
calmamente vinha em minha direção para receber o cabresto e os arreios que eu
mesmo colocava. Não corria nem que se lhe batesse. Ia no seu troteado calmo que
muitas vezes você nem sentia que estava no lombo de um cavalo. Mais tarde um
pouco, comecei a cortar o capim, carregar a carroça com o capim cortado por mim
e descarregar na mangueira para as duas vacas com suas crias e dois cavalos, um
pedrês com os pelos meio azulados, mais propriamente cinza claro, que era só de
carroça, e o cavalo branco de sela no qual eu não conseguia por o pé no estribo
para montar.
Dessa fazenda, meu tio se mudou para
a Fazenda do Dr.Reis na Independência, mais propriamente no Tucumã, onde
existiam duas casas somente. Ali, éramos meeiros, plantávamos arroz, feijão,
algodão e milho. Cultivávamos uma horta, mandioca, batata, hortaliças e tudo o
que se pudesse comer. Vivia-se muito bem
embora a luta diária fosse cansativa. Arar a terra com o arado puxado por
animal, gradear a terra para desmanchar os torrões deixados pelo arado. Depois
da terra pronta ficava a espera angustiante pela chuva, sem a qual não se podia
jogar as sementes no solo pois corria-se o risco de não germinarem., Mas havia
a compensação. Quando o arroz, o feijão e o milho começavam a brotar era aquela
alegria interior por ver os resultados de seu trabalho. E como era gostoso
andar no meio do milharal quando estava
alto já cobrindo a gente. E quando começam aparecer as bagas do feijão, as
espigas do milho ainda pequeninas e o arrozal balançando suas espigas pra lá e
pra cá, de acordo com o sentido do vento. Na hora de colher o milho se sofria
muito. Além do pó que saia da palha ao se quebrar as espigas havia o mato alto
com carrapichos e picão que grudavam na calça. Para retirá-los usava-se uma
faca para raspá-los
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